01 abril 2009

Sua marca, a salvo da reforma ortográfica

O especialista em propriedade intelectual Paulo Afonso Pereira explica que as marcas podem ser grafadas da maneira que a empresa julgar melhor. A única norma a seguir é a da criação

Por: Paulo Afonso Pereira*

Depois de muitas décadas convivendo com um padrão de ortografia, o anúncio das modificações no português ocasionadas pelo Acordo Ortográfico assustou muita gente, gerando enorme expectativa - e muitas dúvidas - em relação à sua aplicação. Afinal, são mais de 200 milhões de pessoas, dos oitos países que têm o português como língua oficial, que terão até 2012 para se adaptar ao modelo. O impacto desta última revisão de 2009 foi sentido de formas diferentes em cada país. No Brasil, por exemplo, as mudanças afetam apenas 0,45% das palavras. Já em Portugal a reforma modifica 1,6% de seu vocabulário. As novas regras mudam exclusivamente a escrita, não interferindo na pronúncia das palavras.

Além dos questionamentos mais comuns, como o uso do hífen e do acento diferencial, vieram dos empresários outras questões importantes: como ficam as marcas registradas que não obedecem às atuais normas? Será preciso corrigir a grafia da minha marca e consequentemente perder força no mercado? Mudança de marca gera muito custo. Então, o melhor é se informar antes de tomar uma decisão equivocada.

Vale lembrar que marca, por definição, é um sinal gráfico, distintivo, visivelmente perceptível, e como tal tem por finalidade comunicar um produto ou serviço. Em recente fórum no qual o assunto entrou em debate, vários especialistas em propriedade intelectual julgaram que a marca, por ser um sinal distintivo, não tem obrigação nenhuma de seguir as regras ortográficas, nem as novas, nem as antigas. Quando falamos em propriedade intelectual, devemos levar em conta que este ramo do direito se divide em propriedade industrial, que protege e registra marcas e patentes, e direito autoral, que registra as obras intelectuais. Cada um absorve a nova ortografia de formas diferentes. Se formos escrever um texto e encaminhá-lo a registro, aqui, sim, a ortografia deve ser observada em toda a sua extensão. Já no caso das marcas, não. Algumas exemplificam muito bem essa afirmação, apesar de não serem consideradas marcas muito fortes, como Armärius, Kavalhada, Kasarão, Kassetão, entre outras.

A palavra destinada a ser marca de produtos ou serviços pode ser grafada da forma que a empresa julgar melhor. A palavra, neste âmbito, constitui um sinal diferenciador; a única norma que alguém tem obrigação de seguir, quando cria uma marca, é a norma da criação. A marca, como sua própria natureza determina, destina-se a criar uma identidade entre um produto ou serviço e seu público consumidor. Nesse sentido, a alteração do sistema ortográfico não tem poder de modificar ou de alterar o direito adquirido por determinada empresa para utilizar uma expressão como marca - assegurando, dessa forma, a relação de confiança existente entre seu produto e o consumidor.

Quem já tem sua marca consolidada no mercado, portanto, pode ficar tranquilo: mesmo que esteja em desacordo com as novas regras, a palavra, ou expressão, que a identifica não precisa ser corrigida ou modificada. O que é um alívio para os empreendedores, já que não precisarão buscar uma mudança na identidade visual da empresa nem arriscar o espaço conquistado no mercado.

Esse processo de fidelização construído com os clientes não pode ser destruído por uma alteração do sistema ortográfico dos países que adotam o português como idioma oficial.

*Paulo Afonso Pereira é especialista em propriedade intelectual, ex-presidente do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (Inpi) e coordenador da Câmara de Propriedade Intelectual da Federação das Associações Comerciais do Rio Grande do Sul (Federasul)

FONTE: http://www.amanha.com.br/NoticiaDetalhe.aspx?NoticiaID=807e08f9-4ff1-4c5d-9283-19d710871ff5